Artigo – A Princesa Isabel é santa?

Artigo de autoria do Conselheiro João Dias Rezende Filho, seminarista da Arquidiocese de São Luís do Maranhão, bacharel em Direito e Teologia, membro da Associação Brasileira de Pesquisadores de História e Genealogia (ASBRAP) e sócio colaborador do Colégio Brasileiro de Genealogia (CBG) e pesquisador. Publicado hoje, 29 de dezembro de 2012, no jornal O Estado do Maranhão, de São Luís.

Recentemente, foi veiculada a notícia de que a Princesa Isabel seria canonizada pela Igreja Católica. Alguém poderia perguntar: quem é a Princesa Isabel? Teria feito algo que a fizesse merecer a honra dos altares? Alinhavamos breves palavras que podem ajudar a vislumbrar quem foi Dona Isabel de Bragança e Bourbon e, após o casamento, Dona Isabel de Orleans e Bragança. Trata-se da mulher brasileira que, durante toda a segunda metade do séc. XIX, foi educada para governar nosso País, ainda que esse preceito constitucional não tenha sido cumprido em 1889, como veremos adiante.

Em texto publicado no Jornal Testemunho de Fé, da Arquidiocese do Rio de Janeiro, edição de 20 de novembro de 2011, Dom Antônio Augusto Dias Duarte, Bispo auxiliar do Rio de Janeiro ressalta as qualidades que ornaram o caráter de D. Isabel e o desconhecimento que muitos brasileiros têm sobre ela: “Conhecendo com mais detalhes a vida dessa regente do Império brasileiro e conversando com várias pessoas sobre a sua possível beatificação e canonização num futuro próximo, fico admirado com suas qualidades humanas e sua atuação política sempre inspirada pelos princípios do catolicismo, e, paralelamente, chama-me atenção o desconhecimento que há no nosso meio cultural e universitário sobre a personalidade dessa princesa brasileira”.

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A Princesa Dona Isabel com seu esposo Dom Gastão, mais conhecido como Conde d’Eu, e seus três filhos.

A Princesa D. Isabel exerceu três vezes a regência do Brasil mostrando-se sempre uma estadista irrepreensível no cumprimento de seus altos encargos constitucionais, como destaca o historiador Otto de Alencar de Sá-Pereira, antigo professor titular da Universidade Católica de Petrópolis e decano do Instituto D. Isabel I: “Antes do advento da República, as atuações da Princesa Imperial Regente demonstraram a competência governativa, a firmeza de princípios e a caridade cristã pujante da Redentora no âmbito político e social. Para além da Lei Áurea, sua ação de Estado é, sob todos os aspectos, modelar.” (CERQUEIRA (org.), 2006, p. 34).

Acusada muitas vezes de carola, menosprezada pela sua profunda fé e piedade, a Princesa D. Isabel procurava colocar em prática, em todos os âmbitos de sua vida, sobretudo em sua atuação política, os princípios basilares de sua fé, o que incomodava a classe política, formada em sua maioria por homens pouco afeitos à religião e influenciados pelos famosos “ismos” do fim de século: positivismo, cientificismo, anticlericalismo etc. Com certeza, a sua visão cristã influenciou-a na defesa dos mais necessitados, sobretudo, como incentivadora da causa abolicionista que abraçou. D. Isabel dirigindo-se ao abolicionista André Rebouças, ainda a bordo do navio que desterrava a Família Imperial disse: “Senhor Rebouças, se houvesse ainda escravos no Brasil, nós voltaríamos para libertá-los.” (NABUCO, Minha Formação, p.182).

E é o reconhecimento pela sua ação em prol da liberdade que levou o mulato José do Patrocínio, um dos tigres da abolição, a cognominar a Princesa Imperial de “A Redentora”. Em interessante depoimento do Sr. Heidimar Marques, no IV volume da obra Memória de Velhos, fica registrado um desses atos de verdadeira gratidão que o povo simples, porém sábio, devotava a D. Isabel. Ao referir-se a uma antiga escrava maranhense, falecida em 1957, ainda lúcida aos 115 anos, o sr. Heidimar conta-nos: “A festa anual de Mãe Calu era 13 de maio, em homenagem à Princesa Isabel. Todos nós sabemos o que significou, na abolição da escravatura, a Princesa Isabel e os revolucionários. Para Mãe Calu, a Princesa Isabel era uma santa. Ela a chamava de Santa Isabel”.  E prossegue descrevendo as festas que a velha negra fazia em reverência à memória da Princesa. É fácil concluir que o culto popular do sensus fidei fidelium, isto é, o senso de fé do povo, não está restrito ao Maranhão, mas se estende por todo Brasil.

D. Isabel está, pois, credenciada ao “posto” de santa? O Concílio Vaticano II, na Constituição Lumem Gentium ao tratar da santidade dos fieis diz: “devem os fiéis conhecer a natureza íntima e o valor de todas as criaturas, e a sua ordenação para a glória de Deus, ajudando-se uns aos outros, mesmo através das atividades propriamente temporais, a levar uma vida mais santa, para que assim o mundo seja penetrado do espírito de Cristo e, na justiça, na caridade e na paz, atinja mais eficazmente o seu fim”.

D. Isabel viveu para promover a justiça e a paz entre os brasileiros, colocando em primeiro lugar, em todas as suas ações, fosse como filha, esposa, mãe, católica, estadista, a Caridade que ilumina os corações e redime das misérias deste mundo. Vivendo em alto grau as virtudes evangélicas, ela preenche os requisitos necessários para ser “candidata” aos altares. Que venham as provas de sua intercessão para que em breve tenhamos, oficialmente, mais uma amiga junto de Deus a nos servir de modelo de discípula de Cristo, Rei dos Reis do Universo e servo fiel.

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